Vivemos sob o fascismo no Brasil?
Por: Varlindo Nascimento – Diretor de Pesquisa e Tecnologia
O termo fascismo vem da palavra latina fasces, que no período do império romano era utilizada como símbolo de força e autoridade. Já no início do século XX o termo foi retomado na Itália por Benito Mussolini para designar a forma de expressão de um governo que se pretendia forte e nacionalista.
O surgimento de governos com esse caráter não se deu só na Itália, mas foi algo comum em vários países da Europa, principalmente no período entre as duas grandes Guerras Mundiais, isso como produto direto da miséria resultante dos conflitos militares que devastaram o continente. Essa situação produziu um terreno fértil para a proliferação de discursos de caráter autoritário e fortemente nacionalistas em países como a Alemanha, Espanha, Portugal, além da própria Itália. Esses governos tinham características particulares, mas compartilhavam uma série de elementos comuns entre si que podem nos servir para realizar uma breve análise que nos ajude na identificação de regimes ou propósitos de regimes políticos que se enquadrem como fascistas.
A primeira característica geral desse modelo de governo era o uso de um forte discurso nacional que criasse ou reforçasse laços de comunidade entre determinado contingente populacional, o que, via de regra, estava atrelado ao uso de uma espécie de origem ou destino heroico comum entre esse grupo de pessoas.
O segundo traço comum estava no forte caráter militarizado imposto à sociedade, não só na perspectiva do reforço do elemento militar no controle das relações sociais, mas principalmente na militarização da vida civil. Cada cidadão comum era convocado a ser um “soldado da pátria”, e aqueles que não se pusessem a esse serviço ou que não alinhasse suas ideias ao regime seria um inimigo potencial, devendo este ser delatado pelos “patriotas”.
A terceira e última característica estava no elemento racista, naquilo que era colocado como caracterização do inimigo comum ao povo nacional, culpado pela crise e pela miséria instalados e elemento que deveria ser eliminado na caminhada da nação em direção ao seu destino manifesto de soberania e autoridade. Por sinal, esse foi o elemento utilizado como justificativa moral para a perseguição aos judeus em vários países, especialmente na Alemanha nazista.
Diante desses elementos, a parte tudo que já foi posto em outros momentos sobre as condições de eleição do atual presidente do brasil, o que podemos trazer para a nossa realidade em relação ao governo que possibilite ou não o classificar como fascista?
Primeiramente, o discurso demagógico nacionalista muito usado pelo presidente empossado, representado pelo culto quase religioso aos símbolos nacionais e pela convocação para uma espécie de sacrifício coletivo do povo, do povo pobre, diga-se de passagem, em nome do futuro da nação, porém, no fascismo quase tudo é farsa sustentada por propaganda. Os atos de campanha e as sinalizações dadas durante o período pós-eleitoral, em que o elemento de subserviência aos interesses da grande potência imperialista (Estados Unidos) esteve presente a todo tempo são uma mostra do que verdadeiramente está por trás dessa cortina de fumaça. A aproximação com os interesses políticos e ideológicos do estado de Israel, principal base dos interesses estadunidenses no oriente médio, é mais um exemplo do caráter submisso do governo. A política de privatizações irrestritas, inclusive de empresas em setores estratégicos à garantia da soberania nacional é outra faceta do entreguismo travestido de nacionalismo.
No que diz respeito ao elemento militarizante ele é ainda mais claro nesse governo. Além do presidente ser um ex militar expulso da corporação, a base parlamentar eleita do seu partido é composta por vários integrantes das forças coercitivas e judiciária, além de simpatizantes desses setores. “seu” vice e “seu” ministério é dominado por militares da reserva, e sua base eleitoral, não falo dos desesperançados nem dos controlados por setores da sociedade como as igrejas, mas os que votaram nele por convicção ideológica estão claramente dispostos a fazer parte de um corpo paramilitar de controle social como é típico do fascismo.
Por último, onde podemos encontrar o elemento do inimigo comum cultivado pelo fascismo? Como ele pode existir num país que é tratado como paraíso do convívio pacífico entre as classes sociais (desde que as classes baixas se comportem dentro de seus limites)? Num país dominado pela cristandade e por valores morais conservadores (mesmo que da porta da igreja para dentro)? Num país que é exemplo do convívio entre as raças (desde que cada negro saiba qual é o seu lugar)? Pois bem, a dica pode ter sido dada durante o “discurso” de posse do presidente. Ao falar que seu plano é eliminar o socialismo do brasil, Bolsonaro não fala necessariamente da forma de governo, a qual, de fato, nunca foi vivenciada por essas bandas, mas fala sim daqueles e daquelas que acreditam nos princípios do socialismo, daqueles que educam conforme preceitos de solidariedade e bem comum, daqueles que se opõe ao modelo econômico que rege a sociedade e que Bolsonaro e Paulo Guedes vão aprofundar.
Dessa forma, podemos encontrar no governo Bolsonaro, pelo menos em potencial, as características centrais de uma forma fascista de governar. Nela quem não é alinhado ou não se permitir alinhar não terá vida fácil sob nenhum aspecto. É preciso consciência sobre esse ponto, é preciso clareza para organizar as formas de resistir e sobreviver, inclusive do ponto de vista da sobrevivência física e individual. A realidade é um dado, a manutenção dela não, tudo é uma questão de organização e correlação de forças e isso é algo que não está dado, não está posto, está em constante movimento e disputa.